Quando
você começou a se interessar pela escrita?
Lembrar dessa gênese é complexo, devido a
quantidade de momentos. Talvez tenha sido quando comecei a escrever as letras
cursivas, e tentava imitar meu pai que tinha uma apostila dum curso do
Instituto Universal Brasileiro, com um curso de Letras Desenhadas. Talvez tenha
sido quando passei a escrever à caneta, porque pra mim, aquele gesto indicava
que eu finalmente estava crescendo e deixando de ser criancinha. Poemas,
especificamente, foi no Colégio Celso Ramos, quando me apaixonei por uma guria
chamada Inajara e escrevi meu primeiro poema, pra ela. O texto fez o maior
sucesso na escola. Foi a primeira vez que fui chamado de poeta.
Você
teve incentivo da família e amigos?
Minha mãe foi minha incentivadora indireta.
Semianalfabeta, não conhecia textos poéticos que não fossem de músicas caipiras
que ela cantarolava enquanto lavava e estendia roupas. Por desconhecer alguns
conceitos - só quando me adultei eu percebi isso - ela me dava respostas para
tudo que eu perguntava, mesmo que não soubesse a resposta. E nesse jogo de
inventar coisas, eu estimulei minha imaginação. Ela me disse as coisas mais
contundentes do mundo: QUE AS COISAS NÃO SÃO TÃO BONITAS VISTA DE PERTO, QUE A
GENTE JÁ NASCE COM A GENTE DENTRO DA GENTE, e outras tantas que fazem parte da
minha biografia.
O que
significa ser poeta pra você?
Ser poeta siginifca ter um poder: perceber. Olhar
no ínfimo o máximo. Se emocionar com coisas que faz a gente parecer
louco.
Quais os
grandes nomes da poesia (Nacional e Internacional), que você admira e/ou se
inspira?
Tem poetas incríveis, tem escritores tão mais
poetas que poetas que se autoafirmam. Poesia pra mim vai além do verso e do
gênero. Mas dentre os que convencionamos chamar de poetas eu citaria Ferreira
GOulart, Mario Quintana, Adelia Prado, João Cabral de Mello Neto, Ariano
Suassuna e Carlos Drummond de Andrade.
Dos estrangeiros, Rimbaud, Neruda, Charles
Baudelaire e Fernando Pessoa.
Cite os
eventos literários que já participou, feiras, seminários, etc.
Não conseguiria citar todos, e tenho o péssimo
hábito de não fazer compilações de mim mesmo, e nem listas. Até meu currículo
Lattes está desatualizado. Mas citaria os de cabeça: Minha defesa do Mestrado
em Educação, um seminário sobre a evolução da literatura infantil em Joinvllle,
na Univille, em 2018, a participação numa conferência sobre Memória na UFSC, em
2017. Mas nada é mais importante, e transformador pra mim, e em mim, do que as
oficinas que realizo há 15 anos dentro das escolas públicas, e os encontros com
anciões dentro de ancionatos e casas de repouso - trabalho voluntário que
exerço desde 2012.
Você já
publicou algum livro? Já participou de alguma antologia? Se sim, descreva
título e ano da publicação/Editora.
Tenho 17 livros publicados. Cito o primeiro e o
último. O BEIJO DE MEPHISTO DE 2002 e ELÍSIA - UMA HISTÓRIA DE AMOR E MORTE,
que irei lançar no começo de 2022. Entre esses, foram livros de poemas,
literatura infantil e juvenil, um romance, uma biografia, e livros de
contos.
Qual foi
sua última poesia escrita? Apresente para nossos leitores.
VERBORRAGIA – Marinaldo de Silva e
Silva
Hipócritas não se cortam,
Só às velas restam cicatrizes
Ouvidos surdos por escudos da ignorância só fazem aumentar o silêncio
O silêncio dos que choram pelos assassinados
O silêncio dos que morreram de susto
O silêncio dos que ficaram com o susto na cara
E se amamentam de cartazes e braços erguidos
Pedindo o saciar duma fome que só aumenta
Duma fome que alimenta a fome ..
Mas os olhos estão bulímicos!
Ah olhos bulímicos que dos que seguram metralhadoras
Dos que tem metralhadoras na língua, e cheios de intenção de matar
Cheios de intenção de se repetir, como poemas mal escritos que chegam a
dar nojo,
Até que alguém pare, leia e diga, incandescentemente:
Mas são poemas!
Como se eles pudessem salvar, como se fossem maiores, como se tivessem
sido gerados à altura da poesia que os imprimiram,
a poesia que, nunca vencida, genial ou desgraçadamente mal escrita,
tenta salvar a vida e por um instante de beleza nas pessoas partidas,
nas discussões acaloradas da verdade, nas feridas de negros, mulheres,
gente de fala errada e verdadeira, homens, cis, gays, muçulmanos, pobres,
amotinados, gente que se descrente em si, de gente com sonho milenar em ficar
bem, de gente que se diverte num risca faca,
de gente que risca a faca na palavra
para amolar o que não sabem ser poesia, mas é.
Fale
sobre a importância do protagonismo feminino na literatura?
As mulheres são essenciais. A tomada de seus
postos, a ocupação de lugares antes restringido apenas aos homens, não pode ser
vista como dominação, mas como legitimização. Ouvir cada vez mais o nome de
mulheres é enaltecer e respeitar um movimento sem volta, que em médio, talvez
até a curto prazo, já não teremos que fazer essa pergunta, porque estará
naturalizado o fato de convivermos em acordo com o fato de sermos humanos. E a
partir daí, as pessoas possam ir ocupando seus lugares sem assombros e sem
arroubos.
Quais autores gosta de ler? Algum deles
influenciou na sua escrita?
Dos autores que gosto, eu digo que gostaria de ter escrito coisas que Gabriel Garcia Márquez e Italo Calvino escreveram. Sou influenciado pelos movimentos que usam o fantástico como cerne. Esses dois autores estão presentes na minha escrita. Há também outros. João Paulo Paes, mais recentemente Caio Fernando Abreu, o maravilhoso Mia Couto. Não gosto de literatura que só revela crueza, e usa palavrão como sinônimo de realismo, como se todo realismo fosse baseado naquela determinada realidade. Gosto de leveza. Não sou masoquista. Gosto de experiências que me deixem melhores, que façam eu sorrir no final do dia. Literatura que perturba, panfletária, só em momentos pontuais.
Fale sobre
a biografia da cantora Perla, fale um pouco sobre o processo de criação, Como
você conheceu a Perla. O livro está sendo vendido? Qual o valor? Onde encontro
o livro?Em quais livrarias?
SOBRE O CONVITE PARA
ESCREVER A BIOGRAFIA?
Em 2013 eu enviei ao fã clube de Perla um poema para ela, inspirado numa
canção chamada ANAHI, que tem um trecho cantado em Guarani. O poema tinha por
objetivo chamar a atenção de Perla para que ela gravasse um vídeo em homenagem
a um grande amigo meu que é seu fã incondicional. Eu conhecia Perla por meio
apenas de alguams lembranças afetivas da infância, mas não era um
"acompanhante" de sua carreira. Mas cada vez que entrava no carro
desse meu amigo, Perla estava presente, foi quando comecei a prestar atenção.
Meu objetivo, além do vídeo, era saber quanto ela cobrava por um show
particular, numa casa, para convidados. Queria presentear meu amigo em seu
aniversário de 50 anos que aconteceria em 2018. Quatro anos depois do poema, em
2017, a irmã de Perla, Stela Pedrozo (falecida em 2020) me telefonou, disse ter
chegado até ela o poema só depois daqueles anos todos, e que ela tinha se
comovido com a maneira como eu havia falado, tentando buscar uma forma de
homenagear um amigo. Disse que foi pesquisar sobre mim na Internet, e descobriu
que eu era um escritor, na ocasião, com 14 livros publicados. Viu meu trabalho,
acompanhou minhas postagens, leu o entrelaçamento que eu tinha, e ainda tenho,
com a busca por um elo entre palavra e Humano, por meio da poesia. Depois de
quinze minutos de conversa ela relatou seu sonho que era ver a história da
carreira da irmã, Perla, escrita numa biografia. Dois dias depois me ligou,
convidando. Eu aceitei na hora. Não tive medo das futuras críticas. Só disse as
duas, já no primeiro encontro em julho de 2017, que eu usaria na narrativa uma
linguagem de um contador de histórias. Não faria uma biografia jornalística,
cheias de estatíscas. Eu contaria uma história como as do "Era uma
vez..."
Devido a Pandemia, nenhuma editora interessou-se em apostar numa
publicação no meio do colapso em que se encontra o mercado editorial. Assim,
assumi a publicação do livro e todas as suas despesas, contratando os serviços
da Editora AmoLer, de Blumenau.
COmo o livro dispendeu 3 anos de pesquisa, chegou um momento em que eu
pensei: preciso virar esta página e concluir este projeto. Em casa, durante o
isolamento mais ferrenho dos primeiros meses, comecei a trocar mensagens com os
fãs da cantora Perla, muitos destes, senhoras com mais de 70 anos de idade, dos
lugares mais distantes dos grandes centros urbanos. Elas queriam avidamente o
livro, e eu, pensando na imprevisibilidade da vida, me sensibilizei com a
própria cantora, que queria ver o seu livro ainda em vida. Assim, lancei uma
edição limitada, e caprichada, com apenas 650 exemplares, dos quais, 150 doei
para a cantora. Nossa expectativa é que a partir da volta do "velho
normal" a cantora possa participar dos tradicionais programas de televisão
e assim, conseguir o apoio de uma editora para o lançamento e distribuição de
novas edições.
Com 294 páginas, com imagens remasterizadas e tratadas por um
profissional da área dando maior impacto no acompanhamento da narrativa, PERLA,
A ETERNA PEQUENINA deverá ser lançado, após "pandemia", em Joinville,
em local já prospectado, num evento onde a mesma trará 8 sucessos de sua
carreira de 50 anos, intercalados por leituras de trechos da biografia. As
músicas serão acompanhadas apenas por piano, onde aproveitaremos o evento para
comemorar os 70 anos da cantora neste ano de 2021.
Como foi minha
relação de intimidade com Perla para a revelação de tantas histórias?
A relação de intimidade com Perla, construída no decorrer desses últimos
4 anos, foi intensa, complexa e também enigmática. Para o livro existir e
montar a ordem que eu imaginava para contar essa história, contei com o apoio
de reportagens antigas, leitura de fotografias, vasculhei revistas antigas,
observei sites que já se pronunciavam sobre ela, tive o apoio de
"testemunhas oculares", fãs que visitaram e participaram da vida da
cantora, e dois encontros com a mesma, cada um deles com 8 dias de convívio.
Nesses encontros é que pude sentir a força da mulher Ermelinda (nome da
cantora) e o carrossel que foi conviver com ela. Mulher de hábitos muito
diferentes dos meus, por ter ficado hospedada em minha casa, tive o privilégio
de vê-la menos artista e mais senhora, com todos os hábitos típicos de uma
mulher convencional: oração, momento de ficar em silêncio, pitacos nas
refeições, dicas de como cuidar das plantas, pedidos para passear sem lugares
pré-determinados. Numa aceitação, sempre, de que somos diferentes um do outro e
é justamente isso que nos faz tão semelhantes, acho que ela percebeu esse meu
apreço, esse meu calar, esse meu olhar, esse meu espanto, esse meu encanto por
estar diante de alguém que falava com formigas, com plantas, que cita a
"virgem" a cada uma hora, e fala da mãe falecida como alguém que está
ao seu lado o tempo todo. Para a construção do afeto também me despi. Contei
das minhas fraquezas, dos meus pais mortos, da minha vida como órfão aos 15
anos, dos meus tempos em que vendia "bacucu" (espécie de marisco, do
mangue), pelas ruas do bairro Fátima e do bairro Guanabara. Criamos um vínculo
pela nossa trajetória e pela maneira "descalça, sem maquiagem, sem
etiqueta e sem grife" com que nos apresentamos.
EXPERIÊNCIA COM
BIOGRAFIAS. ESTA É A PRIMEIRA?
Teoricamente foi minha primeira experiência com biografia. Digo
teoricamente porque tem tanta vida minha dentro dos livros anteriores, ou seja,
tem muita autobiografia deste escritor nos meus personagens. Meu primeiro livro
infantil "POESIA PARA CRIANÇAS QUANDO FICAREM ADULTAS" é todo sobre
minha infância. Não tem essa evidências, mas as reflexões do personagem são
minhas, só muda o nome. Assim, contruí PERLA, A ETERNA PEQUENINA, contando a
vida da cantora, e usufruindo do que ela deixou nas entrelinhas para eu
capturar sua poesia e tentar transpor isso para sua história. No fundo, tem
biografia minha, também, dentro da biografia de Perla, se é que me torno claro.
É a história dela contado pelo meu alicerce poético.
DIFICULDADES EM
MONTAR TODAS ESSAS MEMÓRIAS, FAZENDO ELAS VIRAREM, DE RECORTES, UMA HISTÓRIA?
Construir o texto foi uma exercício de preocupações. Eu desde o começo
já sabia que a narrativa seria feita de ordem cronológica, o que facilita tanto
para o autor - que vai separando os temas por meio de uma linha do tempo linear
- , quanto para o leitor, que não precisa se preocupar em ir e voltar durante a
leitura. Esse recurso é interessante, mas ficquei pensando no público de Perla.
Muitas das pessoas são leitores não tão acostumados com a leitura, alguns são
dos rincões mais distantes do país, outros tem dificuldade de leitura devido a
idade avançada, alguns não tem o nível acadêmico-interpretativo dos
"homos-academikus". Assim eu cativaria o público menos dado a leitura
com um texto linear e buscava ao mesmo tempo alegrar os "críticos"
com uma narrativa mais pautada na linguagem literária. Mas obviamente em alguns
momentos tive que pausar. Isso aconteceu menos pela minha cabeça que ferve e
mais pelas pausas feitas pela própria cantora. Num exercício constante de
paciência, tantas vezes pensei em abandonar o projeto pelo fato de que eu
precisava de respostas e elas costumavam demorar semanas até. O livro poderia
ter avançado mais, inclusive, para outros setores e outras histórias, mas Perla
cansou em algum momento de responder. Evidenciou isso em áudios comigo,
dizendo-se cansada. No meio do trajeto de pesquiso perdeu duas irmãs e seu
papagaio de estimação, e isso arruinou com o seu ânimo.
SER ESCRITOR É...
Ser escritor independente é ser utópico, sonhador, viajão, tudo aquilo
que as pessoas num momento de crueldade podem lhe falar. É ser um apostador, é
viver crendo que tua história chegará, em algum momento, numa mão que lhe
conduzirá para outros patamares. Ser escritor independente é ser chique, ser
esnobe, é ter em sua volta uma aura de que você sabe tudo e conhece todas as
palavras. Também podem achar que você é rico, que pode investir em leitura,
algo que é supérfluo, afinal, para que serve a literatura? Ser escritor
independente é ser provocativo, e ter capital social e cultural, é ser bem
visto, é ser convidado para uma palestra para alguns alunos que não querem
ouvir sobre literatura misturados a outras que conhecem tudo sobre José
Saramago (exemplo). Ser escritor independente é assumir a sua função, é
aceitar-se um profissional que batalha, que vai à luta. É exercer uma profissão
que não é profissão, o que por si só já é uma loucura, é como ser algo que não
existe, é como não-ser.
Para esta primeira edição banquei toda a publicação. 650 exemplares ao
custo de mais de vinte mil reais. Custo alto devido a qualidade do papel e do
material gráfico, ao pagamento de dois artistas (um gráfico para recuperar as
fotos e outro da fotografia para compor a capa), pagamento de um revisor de
texto, de um diagramador, de outro profissional para construir um site para as
vendas, além da própria gráfica. Uma edição limitada e luxuosa com 214
fotografias e todo feito em papel Colchê, com 294 páginas.
Investir esse valor, no meio de uma pandemia, sabendo que faltava uma
grande parte e você teve que emprestar dinheiro faz do escritor independente
uma outra coisa além de tudo que já escrevi: um louco rsrsrsrsrs. (mantenha os
risos, por favor).
NOTA AOS
INTERESSADOS: o livro pode ser encontrado no sitehttps://portamarinaldo.wixsite.com/perla, pelo Mercado
Livre, ou diretamente com o autor, Marinaldo de Silva e Silva por meio do
whattsapp 47 99605-7586, podendo ser adquirido por pagamentos eletrônicos como
transferência ou PIX, ou mesmo depósito bancário.
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